LUGAR SAGRADO
Homossexuais e Trans na Umbanda: O Papel Espiritual do Arco-Íris nos Terreiros Brasileiros
Descubra o papel espiritual dos homossexuais e trans na Umbanda: origens, simbolismos, poder espiritual e missão ancestral na preservação do Axé brasileiro.
11/4/20256 min read


Quando o Arco-Íris se Torna Axé
Nos terreiros do Brasil, há uma presença que reluz como o próprio arco-íris: homens gays, mulheres trans, travestis e pessoas não binárias que assumem papéis de destaque na Umbanda, Quimbanda e Jurema Sagrada.
Muitos lideram templos, firmam giras e sustentam a espiritualidade com coragem e devoção.
Mas por que a espiritualidade afro-brasileira se tornou um refúgio tão forte para a comunidade LGBT+?
A resposta não está apenas na inclusão social — ela nasce de fundamentos espirituais, históricos e simbólicos profundos. Este artigo revela o significado energético e ancestral dos homossexuais na Umbanda, conectando passado e presente, fé e identidade.
1. Raízes Ancestrais da Diversidade na Espiritualidade Afro-Brasileira
A presença LGBT+ nos cultos não é um fenômeno moderno. Desde as antigas civilizações africanas e indígenas, a espiritualidade reconhecia múltiplas expressões de gênero e sexualidade.
Tradições Africanas: O Gênero como Expressão do Axé
Em várias culturas iorubanas e banto, as divindades (orixás) expressam dualidades de gênero e energia.
Oxumaré, o orixá da transformação e do arco-íris, é o símbolo maior da fluidez. É homem e mulher, cobra e arco colorido, ligando céu e terra.
Logunedé, filho de Oxum e Oxóssi, alterna entre o masculino e o feminino, caçador e vaidoso, livre das fronteiras humanas.
Essas divindades já demonstravam que a espiritualidade africana não enxerga o gênero como prisão, mas como força em movimento.
Raízes Indígenas e a “Dupla Alma”
Nas tradições indígenas brasileiras, existiam os chamados “dois espíritos” — pessoas com energia masculina e feminina em harmonia.
Elas eram respeitadas como curadores, xamãs e conselheiros espirituais, justamente por representarem o equilíbrio entre polaridades.
Assim, quando Umbanda e Quimbanda nasceram do encontro entre África, índios e Europa, a diversidade de gênero e sexualidade já era um elemento sagrado e presente.
2. Da Margem ao Centro: O Caminho dos LGBT+ nos Terreiros
Durante muito tempo, a sociedade brasileira — moldada pelo cristianismo — marginalizou quem era “diferente”.
Mas nos terreiros, essas pessoas encontraram acolhimento, voz e poder espiritual.
Por que tantos homossexuais e trans lideram terreiros hoje
Historicamente, a Umbanda foi espaço de resistência. Quando as mulheres começaram a se afastar dos terreiros, reprimidas por valores cristãos, quem manteve o fogo aceso foram gays e trans que não temiam o julgamento social.
Eles assumiram papéis de liderança, tornaram-se sacerdotes, mães e pais de santo, e reergueram templos com coragem e autenticidade.
A Energia do “Desassombro”
Enquanto muitos ainda temiam o olhar alheio, pessoas LGBT+ aprenderam a viver sem medo.
Essa ausência de vergonha é o que lhes permite incorporar entidades fortes e desafiadoras, como Exus e Pombogiras, com naturalidade e entrega total.
A espiritualidade escolheu quem tinha coragem — e coragem nunca faltou aos perseguidos.
3. Pombogira e Exu: A Liberdade Encarnada
Entre as linhas da Umbanda, Exu e Pombogira são as figuras que mais dialogam com a liberdade sexual e a autenticidade.
Pombogira: Senhora dos Caminhos da Alma
Pombogira nasceu do arquétipo das mulheres marginalizadas — prostitutas, dançarinas, curandeiras, e também travestis e trans.
Ela é espelho e libertação: representa o direito de ser quem se é, com vaidade, prazer e espiritualidade.
Muitos médiuns LGBT+ sentem afinidade com Pombogira justamente por reconhecer nela a força da aceitação e da coragem de existir.
“Pombogira não se envergonha de seu corpo.
Ela o veste de poder e o transforma em templo do axé.”
Exu: O Guardião Sem Rótulos
Exu, o mensageiro entre mundos, é energia vital, movimento e desejo.
Ele não pertence a gênero algum — é princípio criador e destruidor, liberdade e disciplina.
Quando um médium homossexual incorpora Exu, a espiritualidade celebra o encontro entre a autenticidade humana e a força bruta do axé.
4. O Simbolismo Energético: O Arco-Íris no Corpo e no Espírito
A energia LGBT+ traz equilíbrio entre os polos masculino e feminino, ativo e receptivo, elementos essenciais no universo espiritual.
Essa integração gera axé dinâmico, capaz de curar, transformar e restaurar harmonia nos terreiros.
Oxumaré e o Mistério da Transformação
Oxumaré, o orixá do arco-íris, representa exatamente esse fluxo de energia que sobe e desce, cria e renova.
Não é coincidência que tantas pessoas LGBT+ sintam forte ligação com ele — Oxumaré é o axé da mutação e da beleza.
Em termos energéticos, o corpo do médium LGBT é como um portal vibracional, misturando o ígneo e o aquoso, o sol e a lua — elementos que os antigos chamavam de mistério andrógino divino.
5. A História das Lideranças LGBT+ na Umbanda e Candomblé
Vários nomes marcaram a história dos cultos afro-brasileiros com orgulho e devoção.
Pai Joãozinho da Goméia
Nos anos 1940, o famoso Joãozinho da Goméia — gay assumido — desafiou o preconceito e levou o Candomblé de Angola aos palcos, preservando o sagrado com dignidade.
Mãe Tata D'Òyá
Uma das primeiras travestis a fundar um terreiro no Nordeste, Mãe Tata foi respeitada por sua mediunidade firme e disciplina ritual.
Essas figuras abriram caminho para que centenas de líderes LGBT+ hoje conduzam giras, ensinem fundamentos e representem o que há de mais autêntico na fé afro-brasileira.
6. O Preconceito Ainda Existe — Mas o Axé é Maior
Mesmo dentro da própria comunidade espiritual, ainda há quem julgue.
Alguns dizem: “Pai de santo gay? Terreiro fraco.” — sem perceber o preconceito embutido nessa frase.
Mas a verdade é simples:
O axé não tem gênero, e o sagrado não mede masculinidade.
Terreiros conduzidos por médiuns LGBT+ florescem porque são sustentados por entrega, estudo e fé verdadeira.
O preconceito é humano, mas a energia é divina — e ela escolhe quem está pronto para servir.
7. O Chamado às Mulheres Cis: Retomar a Força Ancestral
O afastamento feminino dos terreiros — muitas vezes causado pela moral cristã — criou um vazio.
Mas a espiritualidade chama novamente as mulheres cis a voltarem ao seu lugar natural de liderança.
A força da mulher não concorre com o arco-íris — ela o complementa.
O futuro da Umbanda é plural: mulheres, homens, gays, trans, travestis — todos são braços diferentes de um mesmo corpo espiritual.
8. Diversidade nas Religiões do Mundo
A sacralidade da diversidade não é exclusividade brasileira:
No hinduísmo, o deus Shiva aparece em forma andrógina como Ardhanarishvara.
No xamanismo nativo americano, os Two-Spirits são considerados curadores poderosos.
No Japão antigo, sacerdotes travestis chamados kagema realizavam ritos sagrados em templos xintoístas.
Essas tradições mostram que o espiritual reconhece o plural como sagrado em todos os povos e tempos.
Conclusão: A Umbanda é Casa para Todos os Corpos e Almas
Os homossexuais e trans na Umbanda não são exceção, mas expressão da própria alma da religião — livre, acolhedora e transformadora.
Eles mantêm o axé vivo, desafiam o medo e relembram que espiritualidade é, acima de tudo, autenticidade.
A macumba pertence a quem a carrega com amor e respeito.
E enquanto o arco-íris brilhar nos terreiros, o axé seguirá colorindo o Brasil espiritual.
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Perguntas Frequentes sobre Homossexuais na Umbanda
1. A Umbanda aceita homossexuais e pessoas trans?
Sim. A Umbanda é uma religião de acolhimento e liberdade espiritual. O axé não tem gênero — importa a conduta, não a condição sexual.
2. Existe orixá protetor dos LGBT na Umbanda?
Oxumaré é o orixá mais associado à fluidez de gênero e à energia transformadora. Ele representa o equilíbrio entre forças masculinas e femininas.
3. Gays e trans podem incorporar Pombogira e Exu?
Sim. A incorporação depende da mediunidade e não da condição sexual. Muitas entidades se manifestam melhor através de médiuns que vivem sem medo de julgamento.
4. Por que há tantos líderes LGBT+ em terreiros hoje?
Porque a espiritualidade busca coragem, entrega e verdade — qualidades que florescem em quem já enfrentou o preconceito e aprendeu a viver com autenticidade.